segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Ensaio Sobre A Cegueira // Blindness


Vitor: Então, parta logo para a ignorância.

Mila: Que ignorância?

Vitor: Affff. Comece logo a discussão!

Mila: (RISOS) Geralmente eu deixo para assistir aos filmes depois que leio o livro. Por isso, ainda não vi Primo Basílio nem O Caçador de Pipas. Eu estava tentando fazer o mesmo com este aqui, mas a polêmica ao meu redor foi tamanha que não resisti.

Vitor: Qual polêmica?

Mila: A mesma de sempre: uns adoram e outros odeiam. Isso se deve à cabeça fechada das pessoas. Hoje, estava lendo uma reportagem sobre como os alagoanos são "descansados" em termos de fazer críticas.


Vitor: Eu acho que o brasileiro em geral é assim.

Mila: As pessoas só assistem o mesmo gênero de filme, ouve o mesmo tipo de música e não expandem seus horizontes. Obviamente há exceções.

Vitor: Humm... Agora cut this shit e fale do filme! Eu já falei sobre ele aqui.

Mila: Eu gostei demais do filme. Provavelmente, amarei o livro.

Vitor: Eu também. Nos Estados Unidos, torceram muito o nariz para ele. Em Cannes, também. Há também movimentos de cegos reclamando da imagem que o filme passa: que cego é inútil, inválido. Não lembro quais os outros argumentos que eles usaram.

Mila: Os americanos são parecidos com os brasileiros. Eles demoram demais a reconhecer talentos quando não se trata das coisas que vivem assistindo, escutando... As pessoas têm preguiça de pensar. Quanto às reclamações dos cegos, bem, cada um tem seu gosto e capta as coisas de diferentes formas. Para mim, a imagem que o filme passa é de pessoas que enxergavam e que, de repente, se pegam sem ver mais nada a sua frente. E é impossível você ser auto-suficiente quando lhe é subtraída uma habilidade do dia para a noite. Soube que também estavam entrando com ações de danos morais por o filme denegrir a imagem dos "gordinhos", dizendo que o filme era preconceituoso.

Vitor: Enfim! Falemos do filme.

Mila: Parte técnica, por favor!

Vitor: O filme é dirigido por Fernando Meirelles, que fez Cidade de Deus, O Jardineiro Fiel etc. O roteiro é uma adaptação feita por Bráulio Mantovani (também de Cidade de Deus) do livro de José Saramago. O elenco tem diversos atores bastante conhecidos do público, como Julianne Moore (As Horas, Evolução, Os Esquecidos, Longe do Paraíso), Mark Ruffalo (Em Carne Viva, E Se Fosse Verdade, De Repente 30), o mexicano Gael Garcia Bernal (Diários de Motocicleta, O Crime do Padre Amaro, Má Educação), Danny Glover (A Cor Púrpura, Máquina[s] Mortífera[s]), entre outros. O filme foi filmado em São Paulo, Montevidéu e Toronto. A história é basicamente sobre uma epidemia de cegueira branca que toma conta de uma cidade não especificada e, aparentemente, do mundo também.

Mila: Um homem fica cego e, daí por diante, as pessoas que tiveram contato com ele vão ficando cegas e assim continua. Ninguém consegue achar sequer a causa da doença, até porque a cegueira causada por doença é uma cegueira preta quando se vê tudo preto e esta é uma cegueira branca. Assim, também não acham a cura. Acontece que mais e mais pessoas vão ficando cegas. O governo começa a internar as pessoas em lugares isolados, para que fiquem em quarentena, pois há grandes suspeitas de que a doença é contagiosa.

Vitor: As autoridades, temendo o contágio da doença, isolam os contaminados em galpões abandonados.

Mila: A história se passa em um desses galpões, onde foram colocadas as primeiras pessoas “infectadas”. E cada vez mais pessoas são colocadas lá, de modo que o lugar vira uma bagunça(nojento), cada vez mais caótico. Acontece que no meio dessa multidão de cegos está uma mulher que enxerga, mas que se passa por cega para ficar ao lado do marido.

Vitor: Lá as ordens de organização social são desprezadas, levando as pessoas a se valerem dos seus instintos de sobrevivência mais primitivos.
Eu assisti a esse filme logo depois de ver O Nevoeiro. E ambos lidam com temas parecidos, apesar das diferentes abordagens: como as pessoas lidam com situações de caos e anarquia. E normalmente a visualização desse tipo de situação não é das mais animadoras.

Mila: Eu também. Quem não viu o filme eu aconselho que pare de ler aqui. Os dois são filmes filosóficos e psicológicos, e mexem com a nossa apatia. É psicológico porque dá a entender que a "cegueira" é uma doença psicológica, criada pelo terror que as pessoas têm do desconhecido. Sabe quando você vê alguém gripado e acha que vai ficar gripado! É isso. E é filosófico em dois pontos: um, ele faz a gente se questionar sobre o que você faria se você conseguisse ver quando todas as outras pessoas estão cegas. Você seria ético? Ajudaria aos outros? Ou tentaria dominar o mundo?

Vitor: Bom, e eu acho que a atitude da Julianne é muito passiva em detrimento da situação. Ela poderia ter tomado controle de tudo, mesmo sem revelar que enxergava.

Mila: Dois, nos faz pensar nos sistemas totalitários, manipulação de informações, mensagens subliminares. O que leva a eventos como o nazismo e o que ocorre hoje nos EUA com esse medo do resto do mundo (o governo investe pesado em propagandas patrióticas conjuntas com a fomentação do medo da própria população com relação aos outros povos. Inclusive é assim que eles conseguem “ibope” para fazer as lucrativas guerras).

Vitor: Vou menos nesse ponto. Acho que o filme desperta sim diversas discussões. Acho que diversos filmes fazem isso, senão não haveria quem gostasse e odiasse uma mesma produção. Mas acho que a gente apontar todas elas (as interpretações), meio que inibe as outras pessoas de formarem suas próprias opiniões.

Mila: É, mas nós somos críticos e temos de explicar porque achamos algo bom ou ruim. E espero que cada um consiga formar a sua própria opinião, até porque eu gosto de ver pontos de vista diferentes.

Vitor: Bom, achei o filme interessante por abordar um tema semelhante ao do O Nevoeiro, mas com tratamentos diferenciados.

Mila: Você gosta é de ver o circo pegar fogo (risos).

Vitor: Gosto mesmo. A vida seria muito boring sem um circo pegando fogo, sem palhaço dando sinal! ACUDA! ACUDA! ACUDA...

Mila: Acho que de circo pegando fogo em filme já estamos bem servidos. Na vida real, nem se fala.

Vitor: Sem mais declarações! Tico e Teco, Felícia e Mafalda estão estafados por hoje...